terça-feira, 14 de agosto de 2007

Final da estadia em Findhorn

Fotos: Leyla Navarro Lins










Queridos amigos, realmente o tempo é relativo! Às vezes ele passa tão rápido que quando nos damos conta estamos ficando velhos e nãao vimos a vida passar. Tendo entender essa sensação de estar aqui em Findhorn há muito, muito tempo, quando na realidade estou há apenas 2 meses. Será porque levo a vida com calma, num ritmo gostoso, sem engarrafamento, poluição, barulho, hora marcada? Fiz muitos amigos e todos parecem calmos e sem grandes ambições. Cada vez mais, sinto que a vida nas cidades grandes, apesar de oferecer muito, não sobra tempo para usufruir. Tenho lido bastante, aliás li um livro excelente que deve ter no Brasil , mas não conhecia. Non Violent Communication - a language, escrito por um psicólogo Marshall Rosemberg que trabalhou com Carl Rogers. Para quem não ouviu falar é sobre como podemos usar a linguagem de maneira mais empática e com compaixão percebendo o outro. Coisa que nossa cultura competitiva nunca nos ensinou. Sermos vulneráveis e aprender a ouvir os sentimentos do outro. Leiam, pois se tivesse lido há mais tempo teria evitado muitas brigas com pessoas que amei e amo por nada. Vai começar um workshop segunda aqui em Findhorn, mas não poderei fazer pois estou com minha viagem programada. Pena. Farei quando houver no Brasil. Tenho tambem ouvido muita música. E vocês não acreditam, entrei numa aula de canto. As aulas são apenas para perder o medo de botar a voz para fora. Quem sabe no Brasil continuo. Por enquanto apenas grito. Coitado do professor. É igual ao professor de violino do Bolinha, quem se lembra? Outra coisa que percebo é como nos acostumamos com as coisas ruins do nosso país. E não fazemos nada! A CPMF continua nos expoliando ( assinei um manifesto da Fiesp contra), as estradas esburacadas, os hospitais sem atender a população, a segurança , a corrupção, as verbas mal gastas e muito mais. Quando vejo aqui, Anna Barton a dona da casa que estou morando, não tem seguro saúde. Mas o NHS ( National Healthy Service) manda duas vezes por semana uma enfermeira para fazer o curativo de uma úlcera na perna, pois ela não tem condição de ir ao hospital fazer o curativo, pois teria que andar uma certa distância. E o médico já veio aqui visitá-la 3 vezes . Além disso ela recebe uma boa pensão do estado por ter mais de 60 anos e pode pleitear auxílio aluguel. Tenho viajado bastante de ônibus e trem. Não vi até agora um barraco ou um pedinte aqui na Escócia. As estradas não são tão modernas como na França ou Alemanha, mas são conservadas e limpas. Não há problema de segurança. Todos vivem com a janela aberta dando para rua, sem grades. Parece que a honestidade é intrínsica nas pessoas. Agora, o interessante é a maneira como falam.O inglês falado aqui é bem diferente daquele que estamos acostumados, quando não falam gaélico nas costa oeste. Inclusive o nome das ruas é escrito nas 2 línguas. Mas os escoceses são extremamente simpáticos e amigos. Conversam logo e tentam agradar. E são muito alegres. Usam kilt nas festas, e soube que sem cueca por baixo da saia. Very funny indeed! Os ingleses são mais reservados. Aqui em Findhorn são bem diferentes pois já estão acostumados com a internacionalidade da comunidade. E pegam o jeito. Os ônibus são caros para 5 miles pago 2,10 libras=R4$8,00. Pudera, o que tem de velhinho de cabelos brancos mostrando a carteirinha! Quem não é velho paga caro. Os ônibus são sempre vazios e preocupados com os deficientes. Uma plataforma hidraulica é abaixada quando algum deficiente tem que entrar e lugar adequado para cadeira de rodas. Oh, primeiro mundo! Que qualidade de vida! Que repeito pela população! Pena que o clima seja tão ruim!!!! Meu ingles esta melhorando rapidamente. Anna esta corrigindo minha pronuncia e meus erros. Brinco que pago aluguel e tenho aula de inglês como brinde. Ela é inteligente e fala um ingles Londrino, sem ser cockney. Ela diz que vai ficar feliz quando eu falar “and” com sotaque londrino. Falo “and” americano . As outras pessoas não me corrigem, pois entendem tudo e acham que sou muito fluente. Mas estava bem enferrujada. O Festival de Dança Sagrada foi muito animado, com danças o dia todo todos os dias. Vieram muitas brasileiras. Foi muito bonito e até dancei um pouco. Tenho ido aos domingos pela manhã ao Shamballa , o centro budista tibetano, cantar com o couro as músicas sagradas. Aqui não há religião, mas tudo é feito com muita religiosidade. É ir lá participar, mesmo apenas ouvindo o Taize Singing faz muito bem para a alma. Também outro domingo, houve uma festa na Village. Bem festa de interior. Com barraca vendendo churrasco e prendas. Mas numa garage um grupo tocava um jazz maravilhoso. Piano, bateria, trumpet, sax, clarinete e baixo. Fiquei um tempo ouvindo e foi ótimo. Fiz uma viagem linda a Iona, uma ilha pequeninha, considerada sagrada, pois Sto Colomba veio da Irlanda nos anos 700AD e fundou o primeiro monastério por aqui. Lá foi escrito o Livro dos Kells, que está agora na Irlanda. Há uma abadia linda do sec XIII restaurada. Prainhas com areia branca e mar azul. E água gelada. Depois fui para Tobermory, uma cidadezinha na Ilha de Mull. Lindinha, com as casas na beira do cais todas coloridas. Essas duas ilhas ficam nas Hebridas de dentro. No caminho Bens, Glens e Lochs (montes, vales e lagos) com vegetação e cenário muito lindo. Passei por Fort August e Fort Williams e comi siri gigante no cais em Oban enquanto aguardava o ferry para as ilhas. Tenho descoberto a ter muito prazer viajando sozinha. Converso com as pessoas e faço no meu ritmo a viagem. Ia ficar 2 noites em Iona, mas amanheceu chovendo e decidi ir para Tobermorry, dica de um casal jovem que jantei na noite da chegada. Eles estavam hospedados na minha B&B.
Essa semana fui ao Parque Nacional de Cairgorm. Como estava sem carro, fui de trem a Aviemore, cidade bonitinha com uma única rua de comércio e peguei o ônibus para subir a montanha. Lá peguei um trem funicular como o do Corcovado que leva os esquiadores no inverno. Não achei muita graça na paisagem. Mas Anna me disse que andar pelo parque é muito lindo. Mas acho que o que fiz foi para turista de verão. Sem graça. Ia dormir por lá mas voltei no mesmo dia.
E para terminar sobre a minha estada na comunidade, quero contar para vocês o que me encanta é a solidariedade entre as pessoas. Aqui tudo é reaproveitado. Algumas pessoas usam partilhar o carro. Um dia para cada um. Qdo vc nao quer mais alguma roupa ,sapato, você lava arruma e doa para a boutique daqui. Se eu precisar de um casaco por exemplo, vou lá e simplesmente pego para mim. Nao é vendido. Não tem ninguém controlando. A máquina de lavar é de uso comum por meio de fichas compradas ou quem tem uma em casa divide com os vizinhos. O corta grama, o aspirador. A consciência ecológica é grande e a lojinha sóo usa sacola usada. Mas em geral cada um leva a sua bolsa de compras. Não se toma refrigerante e os produtos são orgânicos. O sabonete é sem cheiro, e as pessoas em geral só se tratam com homeopatia, floral ou Welleda. E economia de sabão ecológico e água é normal. Não há desperdício. As pessoas se vestem muito a vontade. Agora é moda usar saia curta sobre calça. Estilo meio indiano. Mas cada um na sua. As crianças vão para a Escola Waldorf e os livros na lojinha são sobre anjos, psicológicos, espirituais. Tudo bem New Age.
Outro dia cozinhei para Anna e uns amigos. Adoraram minha comida. Anna recebe sempre as amigas, que ajudam bastante fazendo compras para ela, vindo sempre aqui enquanto ela está com esse problema na perna. Acho que o mundo seria bem melhor assim. Viver em pequenas comunidades com muita liberdade e muita solidariedade. Essa semana a Rona, uma brasileira quer que eu faça uma comida brasileira com ela para toda a comunidade. O problema é que sou carnívora e aqui tudo é vegetariano! Não sei o que poderemos fazer. Ela sugeriu feijoada vegetariana. Disse para ela que isso para mim é minestrone. Semana que vem vou para casa do Andre, marido da Claudia, no sul da França. Vou encontrar 2 amigas e ficarei por lá três semanas. Alugamos um carro e vamos passear bastante pela Provence, Languedoc e Aquitaine. Não vou levar o laptop, para não ficar preocupada com ele no carro, pois não tem internet em Roquequor. Vou me comunicar pelos cyber cafes. Quando chegar escrevo o Diário de Roquequor.
Volto para pegar a mala para ir para o Tibet e Nepal dia 16 /09 via Londres por 15 dias e depois para a India. Se gostar vou ficar ate janeiro na India. Vou fazer um tratamento ayurvedico por 28 dias no ashram do Sri Vast perto de Auroville, na costa oeste da India. Vocês receberão os Diários do Oriente com as notícias, mas enviarei apenas para quem já me retornou, do contrário acho que alguém não recebeu ou me considera uma chata enviando span. Por favor me avisem quem ainda não avisou. E tambem quero saber as novidades desse nosso pobre gigante adormecido. Estou enviando tambem a poesia Itaca, que minha irma enviou para mim e por favor "Não me esquecam!!!!" “Escrevam!!!!!” “Vou voltar, ai é o meu lugar”,”podem preparar a feijoada que estou voltando”(feijoada com porco, please).
Beijos e blessings!!!!

Ítaca

(Cavafy- 1863-1933)

Se partires um dia rumo a Ítaca

rezes para que seja longo o caminho

repleto de aventuras, repleto de experiências.

Aos Lestrigões, aos Cíclopes

ou ao colérico Poseidon, nunca temas.

Não encontrarás tais seres no caminho

se teu pensamento se mantiver elevado,

se emoção sutil tocar teu corpo e teu espírito.

Nem aos Lestrigões, nem aos Cíclopes,

nem ao feroz Poseidon vais encontrar,

se não os leva na alma,

e se tua alma não os puser diante de ti.

Faz votos de que seja longo o caminho.

Que muitas sejam as manhãs de verão

em que — com que prazer, com que alegria! —

entrarás em portos antes nunca vistos.

Detenha-se nos mercados fenícios

para comprar finas mercadorias,

madrepérolas e coral, âmbar e ébano,

e excitantes perfumes de todos os tipos,

tantos perfumes excitantes quanto possas.